Em um país onde a população já suporta uma das maiores cargas tributárias do mundo, o novo movimento do governo federal para aumentar a alíquota do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) nas transferências internacionais gerou forte reação entre economistas, empresários e representantes do setor produtivo. A tentativa de elevar o imposto por meio de decreto — posteriormente barrada pelo Congresso — revela uma estratégia recorrente: recorrer ao bolso do cidadão para cobrir o crescente rombo nas contas públicas.
A medida, editada em junho pelo governo, tinha como justificativa o aumento da arrecadação diante da escalada das despesas públicas. No entanto, ao ser rejeitada pelo Legislativo por ferir a separação de poderes, o Executivo levou o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF), alegando respaldo legal. A disputa jurídica ocorre em meio a um cenário preocupante: segundo dados da plataforma Gasto Brasil, os gastos públicos já ultrapassaram R$ 2,7 trilhões em 2025, enquanto a arrecadação federal está em torno de R$ 2,05 trilhões.
Para o economista Sillas Sousa, da Unicamp, o problema vai além da legalidade da medida: trata-se de uma distorção na função original do IOF. “O IOF é um imposto regulatório, usado para desestimular comportamentos econômicos específicos, como o uso excessivo de crédito. Mas, com a dificuldade do governo em aprovar aumentos de impostos no Congresso, ele recorre ao IOF por decreto para tapar buracos fiscais”, explica.
Sousa alerta ainda para os efeitos regressivos da medida, especialmente sobre pequenos investidores e consumidores de crédito. “O grande empresário consegue crédito mais barato, muitas vezes via BNDES. Mas o pequeno comerciante e o cidadão comum usam o rotativo do cartão, empréstimos com juros altos — e o IOF incide sobre isso. O impacto é brutal”, afirma.
A crítica é reforçada por Anderson Trautman, vice-presidente jurídico da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB). Ele destaca que a insegurança jurídica provocada por decisões repentinas prejudica diretamente o ambiente de negócios. “O setor produtivo está sendo surpreendido constantemente por mudanças que aumentam a carga tributária. Sem previsibilidade, não há investimento”, critica.
Segundo a CACB, o governo deveria enfrentar o déficit fiscal atacando o real vilão da crise: o excesso de gastos. A entidade defende uma reforma administrativa para reduzir o custo da máquina pública, em vez de recorrer a mais impostos. “É inaceitável que, ao invés de cortar despesas, o governo escolha penalizar ainda mais a população e o setor produtivo com tributos”, diz o presidente da confederação, Alfredo Cotait.
Além do impacto econômico direto, especialistas apontam para um dano mais profundo: a deterioração da confiança no país. “Se o empresário não sabe se amanhã o governo vai mudar a regra, ele não investe. Isso trava a economia, freia a geração de empregos e aumenta a desigualdade”, afirma Sillas Sousa.
A proposta de aumento do IOF evidencia um problema crônico: a tentativa de cobrir rombos fiscais imediatos à custa de quem já paga caro. A crítica que ganha força é direta: enquanto o governo diz agir pelos mais pobres, suas decisões acabam penalizando justamente quem tem menos margem para absorver novos custos.